[Resenha - Companhia das Letras] Os homens que não amavam as mulheres

Título: Os homens que não amavam as mulheres

Autor: Stieg Larsson

Tradução: Paulo Neves

Livro #1 da série Millenium

Editora: Companhia das Letras

Skoob | Leia um trecho

Vem da Suécia um dos maiores êxitos no gênero de mistério dos últimos anos: a série Millennium - da qual este romance, Os homens que não amavam as mulheres, é o primeiro volume. Seu autor, Stieg Larsson, jornalista e ativista político muito respeitado na Suécia, morreu subitamente em 2004, aos cinqüenta anos, vítima de enfarte, e não pôde desfrutar do sucesso estrondoso de sua obra. Seus livros não só alcançaram o topo das vendas nos países em que foram lançados (além da própria Suécia, onde uma em cada quatro pessoas leu pelo menos um exemplar da série, a Alemanha, a Noruega, a Itália, a Dinamarca, a França, a Espanha, a Itália, a Espanha e a Inglaterra), como receberam críticas entusiasmadas. O motivo do sucesso reside em vários fronts. Um deles é a forma original com que Larsson engendra a trama, fazendo-a percorrer variados aspectos da vida contemporânea, da ciranda financeira feita de corrupção à invasão de privacidade, da violência sexual contra as mulheres aos movimentos neofascistas e ao abuso de poder de uma maneira geral. Outro é a criação de personagens extremamente bem construídos e originais, como a jovem e genial hacker Lisbeth Salander, magérrima, com o corpo repleto de piercings e tatuagens e comportamento que beira a delinqüência. O terceiro é a maestria em conduzir a narrativa, repleta de suspense da primeira à última página. Os homens que não amavam as mulheres é um enigma a portas fechadas - passa-se na circunvizinhança de uma ilha. Em 1966, Harriet Vanger, jovem herdeira de um império industrial, some sem deixar vestígios. No dia de seu desaparecimento, fechara-se o acesso à ilha onde ela e diversos membros de sua extensa família se encontravam. Desde então, a cada ano, Henrik Vanger, o velho patriarca do clã, recebe uma flor emoldurada - o mesmo presente que Harriet lhe dava, até desaparecer. Ou ser morta. Pois Henrik está convencido de que ela foi assassinada. E que um Vanger a matou. Quase quarenta anos depois, o industrial contrata o jornalista Mikael Blomkvist para conduzir uma investigação particular. Mikael, que acabara de ser condenado por difamação contra o financista Wennerström, preocupa-se com a crise de credibilidade que atinge sua revista, a Millennium. Henrik lhe oferece proteção para a Millennium e provas contra Wennerström, se o jornalista consentir em investigar o assassinato de Harriet. Mikael descobre que suas inquirições não são bem-vindas pela família Vanger, e que muitos querem vê-lo pelas costas. De preferência, morto. Com o auxílio de Lisbeth Salander, que conta com uma mente infatigável para a busca de dados - de preferência, os mais sórdidos -, ele logo percebe que a trilha de segredos e perversidades do clã industrial recua até muito antes do desaparecimento ou morte de Harriet. E segue até muito depois.... até um momento presente, desconfortavelmente presente.

Fazia muito tempo que queria conhecer essa série, e o relançamento com novas capas - para o lançamento de um quarto volume, escrito por outro autor - trouxe a oportunidade. Infelizmente, o gênio que escreveu a trilogia inicial faleceu em 2004. Sim, o cara era um gênio. Ele aborda tanta coisa no livro que fica até complicado escrever a resenha.

Confesso que tive que ler as primeiras 30 páginas umas três vezes até conseguir realmente entrar na história. Mas, quando isso aconteceu, me viciei completamente na leitura. O livro é enorme - são 522 páginas - e mergulhei nele por quatro dias.

Um senhor de 82 anos, Henrik Vanger, ex-diretor de uma empresa de grande atuação, é assombrado há quase 40 anos por um mistério: o desaparecimento de sua sobrinha-neta de 16 anos, Harriet, em 1966. Ele está convencido de que a garota foi assassinada, e o que é pior, por um membro de sua família. Depois de anos de investigações sem resultado, decide fazer algo novo: contratar um jornalista que ele tem esperanças de que poderá ver o caso com um olhar diferente, e assim perceber algo que ele tenha deixado passar e solucionar o mistério.

O jornalista em questão é Mikael Blomkvist, que acaba de ser condenado por difamação de outro grande empresário. E o que o convence a ajudar Henrik é, principalmente, a possibilidade de conhecer um segredo do passado capaz de fazer com que ele desmascare esse empresário - além da possibilidade de se afastar da revista em que é co-proprietário, a Millenium, e não ficar sem nenhuma atividade no período.

A terceira figura essencial no enredo é Lisbeth Salander, uma garota de vinte e poucos anos com um comportamento um tanto quanto excêntrico. Não se encaixa em rotinas, não tem amigos, mas isso não impede que ela seja uma investigadora fantástica - a melhor da empresa em que trabalha. Lisbeth é extremamente inteligente e perspicaz, a personagem me encantou desde o início. Não que eu aprove tudo o que ela faz - mas entendo que, da forma que ela vê as coisas, faz o que é necessário para poder viver sua vida em paz. Não é uma pessoa comum, e com o tempo o autor explica o porquê de suas atitudes serem dessa forma. É uma personagem forte, que acho que ainda vai me surpreender bastante.

As personagens são muito bem construídas, não consegui ficar indiferente a nenhuma delas. Consegui desvendar parte da trama, mas era algo muito maior do que eu imaginava. A cada descoberta de Mikael e Lisbeth eu ficava mais encantada pela capacidade do autor de revelar cada fato no momento exato.

Como pano de fundo, temos os cenários econômico e financeiro da Suécia, a violência contra a mulher, a invasão de privacidade, o funcionamento do Poder Judiciário no país e, como dito na sinopse, o abuso de poder em geral. É realmente impressionante o fato do autor conseguir abordar tanta coisa sem se perder em nenhum momento e sem tornar o livro cansativo. Pelo contrário, a narrativa é muito ágil e é bem complicado interromper a leitura.

Policial não é um gênero que costumo ler, mas às vezes me aventuro nele e normalmente acabo tendo uma boa surpresa, como a que tive com Os homens que não amavam as mulheres. Tem algumas cenas mais fortes, sim, mas consegui encará-las numa boa. Então, ainda que você tenha o estômago fraco, como eu, acredito que não terá problemas para conhecer a história. E é uma história que vale a pena conhecer.