[Resenha - Belas-Letras] O Último Rei do Rock

Título: O Último Rei do Rock

Autor: Carlos Maltz

Editora: Belas-Letras

Leia um trecho | Skoob

Como é viver à sombra de um mito? Ou, pior, de um legítimo rei do rock: John Lennon. Essa é a sina de Juan LMK, que pelos desígnios do acaso nasceu no mesmo dia, hora e hospital onde morria o gênio dos Beatles. Estamos em 2020, e a banda de Juan, a Paralelepípedos do Óbvio, está decadente e vive das migalhas que caem das mesas dos últimos fãs, quando Juan recebe um convite absurdo e inesperado: tornar-se o garoto propaganda de um novo produto que vai mudar a história da humanidade, o primeiro implante nano-neural para a expansão da inteligência. Juan tem a oportunidade de se tornar o que sempre sonhou em segredo: mais famoso do que John Lennon. Em sua estreia na ficção, o baterista e fundador da banda Engenheiros do Hawaii apresenta, com um olhar psicodélico, irônico e revolucionário, personagens forjados de duas matérias-primas distintas, ou “anjos com um diabo dentro”. Qual delas falará mais alto nesta odisseia do rock? Qual delas fará a diferença na sua vida?

Juan LMK é um integrante de uma banda que até teve algum sucesso mas, em 2020, vive de migalhas. E, o pior, algo o perturba praticamente desde que nasceu: tem obsessão pelo sucesso; nasceu na hora, no dia e no hospital em que John Lennon morria, e acredita que seu destino é ser melhor e mais conhecido do que ele.

Eis que, de repente, é procurado pelo maioral do mercado do entretenimento, que lhe propõe transformar sua banda em um sucesso absoluto, e Juan no garoto propaganda de um lançamento da ciência: o implante nano-neural para expansão da inteligência. Depois de sofrer uma certa manipulação, Juan acaba aceitando a proposta, sem nem saber onde está se metendo. Logo ele percebe que a fama não é como imaginava, e passa a ter que enfrentar várias perdas e verdades.

O livro é narrado em primeira pessoa pelo protagonista. No início, ele nos diz que decidiu dividir sua história conosco, e conversa com uma voz misteriosa em sua mente. Os comentários da voz foram colocados em itálico, para diferenciá-los dos pensamentos do protagonista. No decorrer da narrativa, o leitor descobre de quem se trata. Só uma coisa me incomodou: quando acontecem diálogos, as falas dos interlocutores de Juan são sinalizadas normalmente com travessões, mas as dele não. Achei o recurso confuso, não sei se o objetivo foi deixar em aberto se era uma fala ou pensamento... Depois me acostumei, mas fiquei desorientada no começo.

Esse livro é uma loucura, é bem complicado escrever sobre ele de tão diferente que é a história. No mundo que nos é apresentado por Juan, a tecnologia impera. A privacidade é um artigo raro, mini-câmeras monitoram praticamente todos os locais. A empresa que contrata a banda de Juan (os Paralelepípedos do Óbvio, adorei esse nome de banda! rs), detém basicamente o monopólio de todas as manifestações de entretenimento do planeta -  ou pelo menos do que faz sucesso. E querem ser líderes na indústria da ciência também, mesmo que tenham que abandonar completamente a ética para fazer isso.

Juan é usuário de várias drogas, e confesso para vocês que no início senti que estava realmente dentro da mente de um drogado, porque os pensamentos dele eram infinitamente bagunçados. O autor escreve algumas palavras e expressões da forma como são faladas - inclusive juntando várias palavras em uma só - e também utiliza palavrões durante a narrativa, mas achei que tudo se encaixou perfeitamente no contexto, nada disso me incomodou.

O Último Rei do Rock é repleto de referências musicais - claro que incluindo referências aos Beatles -, e também possui algumas referências literárias. Na verdade, tenho a impressão de que não desvendei todas as referências contidas no texto, mas ficava muito feliz ao encontrar alguma... rs... se tornou até divertido procurar por elas. De vez em quando eu lia uma frase e pensava: "conheço isso de algum lugar" - algumas coisas eu identificava bem rápido, sobre outras ficava pensando por algum tempo.

Adorei acompanhar os dilemas vividos pelo Juan, e a obra permite excelentes reflexões. São mostrados os efeitos colaterais da fama. O protagonista fica cada vez mais desolado e desesperado. Se, no início, ele tinha relutado em aceitar o contrato milionário que lhe foi oferecido, com o tempo, começa a se arrepender de verdade, pois percebe que o preço que pagou foi muito mais alto do que imaginava - precisa abandonar crenças e amigos, tem a história de sua vida completamente distorcida, percebe que talvez tenha vendido sua alma. Mas não é como se ele fosse um inocente injustiçado, o personagem vive em conflito, já que, na verdade, conseguiu a fama que sempre sonhou e começa a se viciar nela.

Conheço algo sobre o poder da mídia, mas fiquei muito assustada com a perspectiva abordada pelo autor - da união dela com a ciência meio que para dominar o mundo. Foi uma leitura que adorei fazer, apesar de ter dado nós na minha cabeça. Só lendo mesmo para conseguir entender a experiência que o livro proporciona.