[Resenha - Geração Editorial] À Sombra da Figueira

Título: À Sombra da Figueira

Autora: Vaddey Ratner

Tradução: Sandra Martha Dolinsky

Geração Editorial

Skoob | Leia um trecho

Para a menina Raami, de sete anos de idade, o fim abrupto e trágico da infância começa com os passos de seu pai voltando para casa na madrugada, trazendo detalhes da guerra civil que invadiu as ruas de Phnom Pehn, a capital do Camboja. Logo o mundo privilegiado da família real é misturado ao caos da revolução e ao êxodo forçado. Nos quatro anos seguintes, enquanto o Khmer Vermelho tenta tirar da população qualquer traço de sua identidade individual, Raami se apega aos únicos vestígios de sua infância — lendas míticas e poemas contados a ela pelo seu pai. Em um clima de violência sistemática em que a lembrança é uma doença e a justificativa para execução sumária, Raami luta pela sua sobrevivência improvável. Apoiada no dom extraordinário da autora pela linguagem, Sombras da Figueira é uma história brilhantemente intricada sobre a resiliência humana. Finalista do Prêmio PEN Hemingway este livro vai levá-lo às profundezas do desespero e mostrar horrores abomináveis. Vai revelar uma cultura maravilhosamente rica, lutando para sobreviver através de pequenos gestos,. Vai fazer com que jamais sejam esquecidas as atrocidades cometidas pelo regime Khmer Vermelho. Vai lhe encher de esperança e confirmar o poder que há ao se contar uma história de nos elevar e nos ajudar não somente a sobreviver, mas à transcendência do sofrimento, da crueldade e da perda.

Esse livro não é meu tipo de leitura habitual. O que me motivou a ler foi o fato de tratar-se de um livro de ficção, só que baseado no que a própria autora viveu. Em 1975, quando os revolucionários tomaram o poder no Camboja, dizendo que estavam implantando uma "República Democrática", um nome bonito que arrumaram para ditadura, Vaddey tinha 5 anos e passou os próximos 4 vivendo de uma maneira horrível. 

Ela é descendente da família real, e por isso tinha que se esforçar para fingir ser outra pessoa, ou seria simplesmente executada. Claro que não foi nada fácil para uma criança entender isso e aceitar que deveria mentir/ omitir. No livro, a autora é representada por Raami. Só alterou um pouco a idade da protagonista, de 5 para 7 anos.Como é a garotinha quem narra a história, achei que a alteração foi necessária.

O Khmer Vermelho, o grupo revolucionário que passou a governar, decidiu que tudo precisava mudar. Tirou toda a população das cidades e a encaminhou para o campo. O objetivo era fazer o país se tornar completamente agrário e adotar o regime comunista. Nada de lembranças. Nada de considerar sua família mais importante que qualquer outro camarada. Nada de propriedade privada de qualquer tipo. Primeiro, foram tiradas as casas das pessoas. Depois, famílias foram separadas. Em seguida, as pessoas começaram a ser mandadas de um lugar a outro, e se dessem sorte de se dar bem com as pessoas que as recebiam, eram arrancadas daquele local e encaminhadas a um novo destino.

- Quando alguém está muito enraizado deve ser arrancado e plantado em outro lugar. (...) Ervas daninhas devem ser arrancadas antes que se multipliquem!

Todos precisavam trabalhar. O que ganhavam em troca era apenas a possibilidade de permanecerem vivos, um lugar nada ideal para dormir, e porções de comida suficientes apenas para não morrerem de fome (às vezes). Durante o tempo em que a Organização esteve no poder, aproximadamente um terço da população morreu - de exaustão, de doença ou por ser considerada indesejável.

Levei por volta de duas semanas para finalizar a leitura. Não porque o livro não seja bom, ele é muito bem escrito, mas porque é extremamente denso. As descrições da autora me fizeram sentir toda a desesperança e o medo das personagens, doía em mim cada vez que algo ruim acontecia. E muita coisa ruim acontece. Tive que ler apenas algumas páginas de cada vez, não suportaria receber todas as informações rapidamente.

- As palavras (...) nos permitem fazer permanente aquilo que é essencialmente transitório. Transformar um mundo cheio de injustiça e dor em um lugar bonito e lírico. Mesmo que só no papel.

Não foi uma leitura fácil, mas foi um livro que me ensinou bastante e que me fez lembrar que devo agradecer todos os dias por tudo o que tenho, por toda a liberdade de que posso usufruir, que foi algo que precisou ser conquistado à custa do sangue de muita gente. Recomendo para quem gosta de livros que fazem refletir e que retratam bem momentos históricos.